sexta-feira, 22 de novembro de 2013

O poder pedagógico da ação afirmativa

O poder pedagógico da ação afirmativa

Jornal Brasil de Fato

Na semana em que se comemorou o Dia da Consciência Negra (20), pode-se concluir que as universidades ganharam e muito com o sistema de cotas. É o que realça a cientista social Monica Santos Francisco, articuladora da Rede Social Borel
22/11/2013
Rogério Daflon,
Do Canal Ibase
 
“Nego, vem pra minha terra
Ser igual a branco
Em qualquer cidade
Vem tentar um banco
De universidade”
Quando Martinho da Vila criou esses versos, nos anos 1970, as ações afirmativas raciais se consolidavam nos Estados Unidos, mas, no Brasil, sob o mito da igualdade racial, sequer eram objetivo de debate. Depois de iniciativas pioneiras como a da UERJ, com base numa lei estadual, o sistema de cotas raciais foi se disseminando pelas instituições públicas de ensino superior e, atualmente, 70% delas já adotam algum tipo ação afirmativa no vestibular para alunos de escolas públicas, negros, indígenas e outros grupos.
Na semana em que se comemorou o Dia da Consciência Negra (20/11), pode-se concluir que as universidades ganharam e muito com esse sistema, como realça a cientista social Monica Santos Francisco, articuladora da Rede Social Borel. “Um cientista social que vem das camadas populares traz outro olhar para academia. E as cotas trouxeram atores sociais como esse, da favela, da perifeira, que vão produzir conhecimento sob um outro ponto de vista”, disse Mônica.
Em abril de 2012, o Supremo Tribunal Federal tomou uma decisão a favor das cotas raciais. Mas Mônica afirma que ainda há muita resistência na sociedade. “As cotas devem existir enquanto houver níveis de níveis de desigualdades nas instituições em que não se percebe a presença do negro. Na própria TV, essa presença não é percebida de maneira proporcional. As cotas não devem se restringir somente às instituições de ensino”, diz ela.
Pesquisadora do Ibase, Marina Ribeiro diz que o racismo continua impregnado no país. “A cota é muito polêmica, porque a sociedade brasileira precisa reconhecer que pratica cotidianamente o racismo. Falar de cotas é enfrentar o racismo brasileiro".
André Lazaro, pesquisador e professor da UERJ, universidade pioneira na sistema de costas, diz que, de 2003, no começo desse processo, até 2008, houve poucas instituições de ensino que adotaram o sistema. Mas, frisa ele, nos últimos cinco anos, a situação mudou. Para melhor. “Houve um avanço no Brasil como um todo. Mas há que se divulgar melhor entre as escolas públicas o direito a cotas. Na UERJ, 45% das vagas para cotas não são preenchidas em sua totalidade. Isso revela uma desconexão entre a universidade e o ensino médio público”.
Lázaro, contudo, diz que os cotistas que entraram na UERJ mostram bom desempenho e concluem mais seus cursos do que os não cotistas. Pesquisas, enfatiza ele, provaram que a falta de base de alguns alunos não foram empecilho a uma boa formação. “O importante não é como entra, mas como sai. E os resultados de quem entra por cota mostram que eles saem preparados para o mercado de trabalho”.
Para o professor, o mito da democracia racial brasileira apazigua, enquanto a discussão sobre cotas revela uma violência institucional com a qual a grande mídia tem dificuldade de lidar. “A mídia brasileira é dominada por um conjunto de dez famílias e ela depende de manter o estado acuado. Para população brasileira, a mídia gostaria de passar a imagem de que o problema é o estado, e não a sociedade. O ataque as cotas pela mídia tem a ver com o fato de elas terem sido geradas pelo estado. Além disso, a grande mídia teme que as cotas se estendam às empresas privadas. No caso dos veículos de comunicação, o temor é que cheguem à publicidade”.
André Lazaro ressalta, por fim, que cotas não são caridade. “Esses jovens que chegaram através de cotas têm um saber extremamente relevante e a presença deles na sala de aula é a de novos atores políticos e de novas experiências culturais. As cotas promovem uma renovação de lideranças sociais pelo acesso à universidade”.
Com organização da pesquisadora Cristina Lopes, do Fundo Baobá, o Ibase lançou uma cartilha em que explica a questão das cotas.  Aqui o endereço para baixá-la em pdf:http://www.ibase.br/userimages/cart_ibase_cotas_final

Nenhum comentário:

Postar um comentário