24 de abril de 2015
El Pais
A lei da terceirização é boa? Depende
se você é patrão ou funcionário
A lei da
terceirização é boa? A resposta para essa pergunta
depende muito da posição no mercado que você ocupa. Ela terá consequências diversas para
patrões e trabalhadores, e atingirá de forma diferente o setor público e o privado.
De acordo com o texto aprovado na Câmara na noite desta quarta, empresas particulares podem terceirizar
todas as atividades, tanto as atividades-meio (que são aquelas que não são
inerentes ao objetivo principal da companhia), quanto as atividades-fim, que
dizem respeito à sua linha de atuação.
A reportagem é de Gil Alessi e
publicada por El País, 23-04-2015.
A advogada trabalhista e professora
da PUC-SP Fabíola Marques afirma que a nova lei da terceirização só é boa para o patrão, “que vai
terceirizar sempre que isso lhe trouxer uma redução de custos". De
acordo com ela, a medida trará
economia na folha de pagamento e nos encargos trabalhistas das empresas. Mas uma
consequência direta dessa economia é “a redução do valor pago ao empregado terceirizado, que terá sua
situação precarizada”. Ou seja, se o empresário gasta menos ao
terceirizar, o valor pago à companhia contratada – que conta com sua própria
hierarquia e também busca o lucro – será menor, e o salário que essa empresa paga a seus funcionários
será mais baixo do que o recebido antes.
Segundo Marques, outra faceta negativa da
terceirização para os trabalhadores é o enfraquecimento dos sindicatos, o que também afetaria
negativamente os salários. O projeto de lei não garante a filiação dos terceirizados no sindicato da
atividade da empresa, o que pode ser prejudicial. “Se antes o faxineiro
de um banco fazia parte do sindicato dos bancários, que é forte, após a
terceirização ele integrará a entidade de classe da empresa terceirizada”,
afirma Marques.
Os terceirizados podem passar a ser
representados por diferentes categorias, e perdem benefícios conquistados pelo setor, como piso salarial maior e plano de saúde, além de
ver seu poder de barganha
reduzido. Por sua
vez, os sindicatos fortes
também são prejudicados pela terceirização, uma vez que irão ver o seu número de filiados minguar.
O mercado alega que com o modelo
atual, as empresas acabam arcando com muitos encargos – incluindo eventuais
processos trabalhistas -, o que gera um receio de contratar e prejudica a
criação de postos de trabalho. Com a alteração na lei aprovada, existe um
discurso do setor de que, com parte das responsabilidades compartilhadas com
uma terceirizada – caberá a ela arcar com encargos trabalhistas -, haveria um
aumento no número de vagas no mercado e um incremento no emprego. Esse ponto é
questionado por centrais sindicais e especialistas, já que nada garante que
haverá um aumento de contratações.
“Não existe relação direta entre a
lei da terceirização e a abertura de novas vagas de trabalho”, afirma André
Cremonesi, juiz titular da 5a vara do Trabalho de São Paulo. De acordo com ele,
"no dia seguinte à sanção da lei as empresas começarão a terceirizar sua
força de trabalho". Ele acredita que em um processo gradual, "não da
noite para o dia", haverão
menos trabalhadores contratados diretamente e mais terceirizados, sendo
que o percentual de pessoas que podem se ver "nessa situação
precária" chega, em teoria, "a quase 100% do total de 100 milhões de
pessoas economicamente ativas [incluindo trabalhadores informais,
microempresários e etc]". Segundo ele, atualmente 12 milhões de pessoas são terceirizadas.
Ele acredita que, caso a lei seja
sancionada, haverá “uma avalanche
de ações trabalhistas, com muita gente questionando a constitucionalidade da
terceirização”. O magistrado afirma que como muitas vezes a terceirizada
não tem patrimônio, o pagamento
das indenizações ficará a cargo da empresa contratante. “Essa lei é um
retrocesso”. Cremonesi afirma que este processo irá reduzir o poder de compra do
trabalhador, e pode
provocar uma queda no consumo no médio prazo.
A polêmica em torno do assunto ainda
continua. O presidente do Senado, Renan Calheiros (PMDB-AL), classificou a terceirização da
atividade fim como uma "pedalada" no direito do trabalhador, abrindo
uma frente de conflito com
o presidente da Câmara, Eduardo Cunha (PMDB-RJ), defensor da lei, que
poderia atrasar o envio do projeto ao Senado.
Gaudio Ribeiro, assessor de ministro no Tribunal Superior do Trabalho (TST) e
coordenador dos cursos jurídicos do Instituto Brasileiro de Mercado de Capitais
(Ibmec) de Brasília, defende a nova lei, mas reconhece que as empresas
terceirizadas “têm uma
saúde financeira precária, trabalham no limite, e muitas vezes se veem
obrigadas a suprimir direitos". Ele afirma que frequentemente elas
não concedem equipamentos
de proteção e nem férias, "e consequentemente o número de acidentes de trabalho
costuma ser mais elevado”.
Ribeiro acredita que o contrato ideal é “a contratação direta com prazo
indeterminado”, mas que isso é inacessível “para uma grande parte da população
economicamente ativa”. Logo, ele afirma que a terceirização pode abrir portas
para que jovens entrem no
mercado de trabalho, ainda que em condições mais precárias.
Outro ponto polêmico do projeto é que
a Câmara reduziu de 24
para 12 meses o prazo que a empresa precisa esperar para poder recontratar algum funcionário
que era contratado com base na CLT demitido para tornar-se terceirizado.
Especialistas afirmam que esse ponto favorece ainda mais a precarização do
trabalho, já que incentiva a terceirização de funcionários registrados.
E, caso seja sancionada como está
pelo Senado e pela presidenta Dilma Rousseff, a medida pode valer para
os contratos atuais. Ou seja, vale para novas contratações e para funcionários
que já estão há anos em uma determinada empresa.
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