terça-feira, 17 de novembro de 2015

Os frutos brutais da primavera árabe - Fernando Brito para Tijolaço

Os frutos brutais da primavera árabe

swas
O texto publicado hoje por Leão Serva, na Folha, é a contestação (tardia, é verdade) de que não eram “loucos pró-ditadores” os que sempre apontamos a intervenção militar e política do Ocidente sobre o processo político no Oriente Médio.
Não é novo, vem dos tempos de Nasser, no Egito, nos anos 60, ou de Mossadegh no Irã, uma década antes.
No novo século, diz Serva, ” a imprensa saudou as rebeliões que ficaram conhecidas sob o genérico “Primavera Árabe” como se fossem levantes de grupos democratas contra ditaduras”. E alinhou-se, como quase sempre,  às posições dos EUA, o que o jornalista chama de alinhar-se com os países da Otan, o que, na prática e com um pouco mais de suavidade verbal, dá no mesmo:

Foi assim que o retrato da rebelião no Egito nem de perto sugeria que os “democratas” anti-Mubarak viriam a perseguir cristãos; ou que a queda do ditador poderia significar a eleição democrática de um governo islâmico antidemocrático; ou que a queda de Muamar Kadafi fosse resultar em um caos de estilo afegão. Nada jamais sugeriu que a alternativa ao regime de partido único de Bashar al-Assad seja uma miríade de partidos, seitas e etnias, todas com múltiplos antagonismos. Perto da Síria, a multiplicidade balcânica é uma história de ninar.
Mais que a ilusão ocidental, o sentimento de onipotência e a incapacidade de formular políticas menos vorazes econômica e politicamente para o mundo – o episódio da espionagem eletrônica de governos não-hostis (para ficar na linguagem deles) mostra a incapacidade dos EUA de agir com um mínimo de respeito à soberania dos países – levou à situação  que chegamos.
Os países do Ocidente estão pagando caro pelo alinhamento à ilusão criada pela estratégia americana nascida das cinzas das Torres Gêmeas: a de que era necessário intervir no Oriente Médio para criar democracias ao estilo americano. O primeiro laboratório, Iraque, é hoje muito mais instável do que antes, em vez de exportar petróleo, passou a produtor de conflitos étnicos e terroristas. E os aliados dos EUA na Europa, por mais que sejam meros coadjuvantes, vêm, um a um, sofrendo ataques terroristas que suas populações, naturalmente, não estão preparadas para assistir.
Leão Serva vê o que já não é difícil vislumbrar, embora ainda seja tempo de conjurar: o “início de uma nova fase da Terceira Guerra Mundial” , onde “mais países vão atacar áreas do Oriente Médio e sofrerão ataques em seus territórios”.
E sente cheiro do período do ressurgimento de uma brutalidade nazista, ao dizer que “2016, que já não cheirava bem, está com cara de 1936”.
Não se pode dizer que a imprensa, que deixou de ver os frutos que a tal primavera iria gerar, esteja um milímetro mais consciente de que aduba, todos os dias, também aqui, a formação de extremistas, brutais e criminosos. Tal como lá, naqueles dias primaveris, apresenta-os como desejosos da democracia e da moralidade.
No mundo global, vão longe as sementes da estupidez.
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